Não é uma tirada política. Nada disso. É apenas uma manifestação que quero fazer ao reaproveitamento de um prato. Porque comer algo que sobrou de outra refeição não tem de ser monótono. Nesta altura temos de deixar fluir o espírito criativo e dar a volta à questão. E literalmente matar um coelho com duas cajadadas só.
Anda já há muito tempo a pensar no que poderia fazer um coelho. Não é algo que se coma muito cá por casa, e na minha infância não foi carne para puxar a minha carroça. Digamos que não o detestava, mas também não morria de amores por ele. Comia-o sobretudo fora de casa. Lembro-me de um coelho assado que comi que estava muito bom ou de um arroz feito pelo Nuno Diniz que estava também divinal. Mas não posso dizer que seja uma presença constante no meu cardápio.
Mas algo me empurrou para esta escolha. E depois de ler um pouco, atirei-me a um coelho inteiro. Fiz da minha maneira teste: Estufado em vinho branco, com cebola e alho. Ervas da Provence, sal e pimenta fizeram o tempero. Uma hora em lume brando no fogão e depois vai mais uma hora para o forno. Estava o teste feito. Deliciosamente feito.
Desse prato não há registos. Mas sobrou uma parte do coelho (estava bastante bom, mas era muito). Decidi que iria fazer um prato novo. A Luísa sugeriu. Uma massada de coelho. Com tomate e ervilhas. Nem pensei duas vezes. Atirei-me logo ao dito. Desfiei o coelho e coloquei-o com o tomate cortado aos cubos em lume brando e um pouco de água. Teria de o deixar “apurar” e ganhar novo gosto. Uma hora depois estava pronto para juntar as ervilhas. Deixei também cozinhar mais uns minutos, mas agora em lume médio e rectifiquei de sal. Queria preservar aquele lado doce das ervilhas, e não as queria cozinhar demais.
Assim que tudo estava no ponto, juntei a massa. Aumentei um pouco o lume para despachar a coisa. A hora do almoço estava a chegar e tinha de ter tudo na perfeição. Deixei cozinhar a massa até ficar “al dente” que é como se gosta aqui por estas bandas. Só posso dizer que se amei o coelho no binómio estufado/assado, este estava muito melhor. Um prato simples. Com gostos simples. Capazes de trazer tanta alegria ao nosso palato.
Não é a comida mais bonita do mundo. Nem e isso que se pretende. Aqui está o sabor. O sabor de um prato que lembra o campo e os tempos de antigamente. Por mais voltas que lhe dê, este é um daqueles pratos que nunca vai ficar bonito numa foto. Mas tem lá todo o sabor.
Partilhem comigo aquelas receitas que vos ficam no coração e que quase sempre conseguem sair do nada, porque este, é apenas um coelho com tomates.